segunda-feira, 6 de abril de 2009

A INDÚSTRIA CULTURAL

A partir de quando poderíamos falar em indústria cultural ou cultura de massa? E mais, o que significam esses termos? Por que associar indústria a cultura? Que tipo de mercadoria essa indústria afinal de contas produz? Como nos capítulos anteriores, este também se inicia com perguntas, às quais tentaremos responder.
Talvez possamos falar em indústria cultural com segurança a partir do século XVIII. O fato marcante foi a multiplicação de jornais na Europa. Se até a idade média a leitura e a escrita eram privilégios do clero e de parte da nobreza, isso se modifica no capitalismo. As características básicas do novo modelo socioeconômico que se impunha eram a urbanização, a industrialização e, principalmente, a criação e ampliação do mercado consumidor. As cidades passam a ser pólos de importância social, econômica e cultural. A população vai abandonando o campo rumo à cidade e ao trabalho nas fábricas. A mecanização barateia os produtos e, conseqüentemente, aumenta o mercado consumidor. A burguesia comercial e industrial se estabelece como classe hegemônica, e crescem as classes médias. Esse novo público vai ser conquistado pelo mercado em geral e, também, pelo mercado de bens culturais.
É nesse sentido que os jornais assumem grande importância. Paralelamente ao barateamento do papel, há uma elevação do número de leitores, uma tendência que se impõe. Os jornais divulgam noticias, crônicas políticas e os chamados folhetins (precursores do romance e das novelas de tv atuais). A estória que os jornais publicavam nos rodapés de suas páginas vinha em capítulos, obrigando o leitor a comprar o próximo exemplar para saber a continuação da trama.
Stuart Hall, sociólogo norte-americano, afirma que não se pode pensar em cultura erudita ou em cultura popular sem antes considerar a existência da industria cultural. O jornal do século XVIII certamente já interferia na produção e divulgação das idéias, bem como o predomínio de umas, e não de outras.
Além disso, se lembrarmos o quanto a sociedade estava mudando nesse período, poderemos compreender a atitude dos primeiros folcloristas ou colecionadores, que queriam coletar e preservar as velhas canções populares, ao perceberem que a nova sociedade dava cada vez menos espaço para essas manifestações culturais. As populações camponesas chegavam às cidades e tinham que se adaptar ao seu ritmo alucinante. O lazer e a arte que elas praticavam no seu dia-dia, no campo, sem separá-los de sua rotina, passam a lhes ser oferecidos por profissionais que vivem exatamente da arte e do lazer: companhias de teatro, os circos, os balés, que a partir de agora ocupam um espaço na divisão social do trabalho.
Mas por que chamar isso tudo de cultura de massa ou de industria cultural? O primeiro termo faz com que vejamos a sociedade moderna como uma sociedade de massas, de multidões padronizadas e homogêneas, ou no máximo compartimentalizadas em setores com características semelhantes. O segundo termo remete às idéias de produção em série, de comercialização e de lucratividade, características do sistema capitalista. Podemos imaginar, então, o estabelecimento de uma industria produtora e distribuidora de jornais, livros, peças, filmes, em resumo de “mercadorias culturais”.

INDÚSTRIA CULTURAL OU CULTURA DE MASSA
O termo indústria cultural foi criado por Theodor Adorno (1903-1969) e Max Horkheimer (1895-1973), membros de um grupo de filósofos conhecidos como Escola de Frankfurt. Ao fazerem a análise da atuação dos meios de comunicação de massa (mdcm), esses autores concluíram que eles funcionavam como uma verdadeira indústria de produtos culturais, mas, mais do que isso, vende imagens do mundo e faz propaganda deste mundo tal qual ele é e para que ele assim permaneça.
Segundo os dois autores, a indústria cultural pretendia integrar os consumidores das mercadorias culturais, agindo como uma ponte nociva entre a cultura popular e a erudita. Nociva porque retiraria a autenticidade da primeira e a seriedade da segunda. Ambos autores, vêem a indústria cultural como qualquer indústria, organizada em função de um público-massa, abstrato e homogeneizado, e baseado nos princípios do lucro.
Poderíamos pensar, a partir do que os autores indicam, que a indústria cultural venderia mercadorias culturais como pasta de dentes ou automóveis, e o público receberia esses produtos sem saber diferenciá-los ou sem questionar seu conteúdo. Assim, após uma sinfonia de Beethoven, uma estação de rádio poderia veicular o anúncio de um restaurante e, depois dele, noticiar um golpe de Estado ou terremoto, sem nenhuma profundidade, e mais sem nenhuma discussão. Nesse sentido, é preciso observar como essa sucessão de música, propaganda e noticia ilustra o caráter fragmentário dos MDCM, principalmente o rádio e a televisão.
Os meios tecnológicos tornaram possível reproduzir obras de arte em escala industrial. Para os autores, essa produção em série (por exemplo, os discos de música clássica, as reproduções de pinturas, as músicas eruditas como pano de fundo de filmes de cinema) não democratizou a arte. Simplesmente, banalizou-a, descaracterizou-a, fazendo com que o público perdesse o senso crítico e se tornasse um consumidor passivo de todas as mercadorias anunciadas pelo MDCM. Nesse caso, o fato de um operário assobiar, durante o seu trabalho, o trecho da ópera que ouviu no rádio não significaria que ele estaria compreendendo a profundidade daquela obra de arte, mas que apenas ele a memorizou, como faria com qualquer canção sertaneja, romântica, ou mesmo um jingle que ouvisse no mesmo rádio.

Para adorno, a industria cultural tem como único objetivo a dependência e a alienação dos
homens. Ao maquiar o mundo nos anúncios que veicula, ela caba seduzindo as massas para o consumo das mercadorias culturais, a fim de que elas se esqueçam da exploração que sofrem nas relações de produção. A indústria cultural estimularia, portanto, o imobilismo.
Ao contrário de Adorno e Horkheimer, Marshall Mcluhan (1911-1980) via a atuação dos MDCM de maneira otimista. Estudando principalmente a televisão, o autor acreditava que ela poderia aproximar os homens, diminuindo as distâncias não apenas territoriais como sociais entre eles. O mundo iria transformar-se, então, numa espécie de “aldeia global”, expressão que acabou ficando clássica entre os teóricos da comunicação.
O crítico Umberto Eco, por sua vez, faz uma distinção polêmica entre os autores dedicados ao estudo da indústria cultural. Segundo ele, esses autores dividem-se entre “apocalípticos” (aqueles que criticam os meios de comunicação de massa) e “integrados” (aqueles que os elogiam).
Entre os motivos para criticar os MDCM, segundo os “apocalípticos”, estariam:
· A veiculação que eles realizam de uma cultura homogênea (que desconsidera diferenças culturais e padroniza o publico);
· O seu desestímulo à sensibilidade;
· A sua definição como simples lazer e entretenimento, desestimulando o público a pensar, tornando-o passivo e conformista;
Nesse sentido, os MDCM seriam usados para fins de controle e manutenção da sociedade capitalista.
Entre os motivos para elogiar os MDCM, apontados pelos “integrados”, estariam:
· Serem os MDCM a única fonte de informação possível a uma parcela que sempre esteve distante das informações;
· As informações veiculadas por eles poderem contribuir para a própria formação intelectual do público;
· A padronização de gosto gerada por eles funcionarem como um elemento unificador das sensibilidades dos diferentes grupos.
Nesse sentido os MDCM funcionariam como fundamentais para a manutenção e a expansão de todas as sociedades democráticas.
Eco irá criticar as duas concepções, os “apocalípticos” estariam equivocados por considerarem a cultura de massa ruim simplesmente por seu caráter industrial. Para Eco, não se pode ignorar que a sociedade atual é industrial e que as questões culturais têm que ser pensadas a partir dessa constatação. Os “integrados”, por sua vez, estariam errados por esquecerem que normalmente a cultura de massa é produzida por grupos de poder econômico com fins lucrativos, o que significa a tentativa de manutenção dos interesses desses grupos através dos próprios MDCM. Além disso, não é pelo fato de veicular produtos culturais que a cultura de massa deva ser considerada naturalmente boa, como querem os “integrados”.
Eco acredita que não se pode pensar a sociedade moderna sem os MDCM. Nesse sentido, sua preocupação é descobrir que tipo de ação cultural deve ser estimulado para que os MDCM realmente veiculem valores culturais, remetendo aos intelectuais, o papel de fiscalizar e exigir que isso aconteça.
Outro autor também ligado á Escola de Frankfurt, mas com uma concepção diferente do papel da indústria cultural, é Walter Benjamin (1886-1940). Para ele, a revolução tecnológica do final do século XIX e inicio do século XX não acabou com a cultura erudita, como pensavam Adorno e Horkheimer, mas alterou o papel da arte e da cultura. Os MDCM e suas novas formas de produção cultural propiciariam mudanças na percepção e na assimilação do público consumidor, podendo, inclusive, gerar novas formas de mobilização e contestação por parte desse público.
Para Benjamin, a possibilidade de reprodução técnica das obras de arte retirou delas seu caráter único e mágico (o que ele chama de sua “aura”). Em compensação, possibilitou que elas saíssem dos palácios e museus e fossem conhecidas por um número infinito de pessoas. Por exemplo, a reprodução fotográfica permitiu que qualquer pessoa pudesse ter em sua sala as clássicas Monalisa e Santa ceia, Leonardo da Vinci; a reprodução fonográfica fez com que muito mais pessoas pudessem escutar (e quantas vezes quisessem) uma sinfonia de Mozart.
O impacto que a indústria cultural moderna pode provocar no público não seria, portanto, necessariamente negativo, podendo, ao contrario, contribuir para a emancipação desse público e para a melhoria da sociedade, uma vez que ampliaria o seu horizonte de conhecimento.
Muitos críticos consideram a visão de Adorno e Horkheimer sobre a indústria cultural conservadora. Segundo eles, a posição desses autores, ao dizerem que a indústria cultural banalizaria a cultura erudita (que eles denominavam “alta cultura”) valorizavam a cultura burguesa. E não apenas isso, seria também uma depreciação da cultura popular, que, segundo eles, ficaria ainda mais simplificada no âmbito da indústria cultural, e a própria capacidade crítica do povo, considerado mero consumidor de mercadorias culturais, produzidas industrialmente.






sexta-feira, 3 de abril de 2009

conceitos para não ser um xenófobo.



O QUE É ETNOCENTRISMO?
(do Livro: "O que é Etnocentrismo", Everardo Rocha, Ed. Brasiliense, 1984, pág. 7-22)

Etnocentrismo é uma visão do mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência. No plano intelectual, pode ser visto como a dificuldade de pensarmos a diferença; no plano afetivo, como sentimentos de estranheza, medo, hostilidade, etc.
Perguntar sobre o que é etnocentrismo é, pois, indagar sobre um fenômeno onde se misturam tanto elementos intelectuais e racionais quanto elementos emocionais e afetivos. No etnocentrismo, estes dois planos do espírito humano - sentimento e pensamento - vão juntos compondo um fenômeno não apenas fortemente arraigado na história das sociedades como também facilmente
Assim, a colocação central sobre o etnocentrismo pode ser expressa como a procura de sabermos os mecanismos, as formas, os caminhos e razões, enfim, pelos quais tantas e tão profundas distorções se perpetuam nas emoções, pensamentos, imagens e representações que fazemos da vida daqueles que são diferentes de nós. Este problema não é exclusivo de uma determinada época nem de uma única sociedade. Talvez o etnocentrismo seja, dentre os fatos humanos, um daqueles de mais unanimidade.
Como uma espécie de pano de fundo, acerca da questão etnocêntrica temos a experiência de um choque cultural. De um lado, conhecemos um grupo do eu", o "nosso" grupo, que come igual, veste igual, gosta de coisas parecidas, conhece problemas do mesmo tipo, acredita nos mesmos deuses, casa igual, mora no mesmo estilo, distribui o poder da mesma forma empresta à vida significados em comum e procede, por muitas maneiras, semelhantemente. Aí então de repente, nos deparamos com um "outro", o grupo do "diferente" que, às vezes, nem sequer faz coisas como as nossas ou quando as faz é de forma tal que não reconhecemos como possíveis. E, mais grave ainda, este outro" também sobrevive à sua maneira, gosta dela, também está no mundo e, ainda que diferente, também existe.
Este choque gerador do etnocentrismo nasce, talvez, na constatação das diferenças. Grosso modo, um mal-entendido sociológico. A diferença é ameaçadora porque fere nossa própria identidade cultural. O monólogo etnocêntrico pode, pois, seguir um caminho lógico mais ou menos assim: Como aquele mundo de doidos pode funcionar? Espanto! Como é que eles fazem? Curiosidade perplexa? Eles só podem estar errados ou tudo o que eu sei está errado! Dúvida ameaçadora?! Não, a vida deles não presta, é selvagem, bárbara, primitiva! Decisão hostil!
O grupo do "eu" faz, então, da sua visão a única possível ou, mais discretamente se for o caso, a melhor, a natural, a superior, a certa. O grupo do "outro" fica, nessa lógica, como sendo engraçado, absurdo, anormal ou ininteligível. Este processo resulta num considerável reforço da identidade do "nosso" grupo. No limite, algumas sociedades chamam-se por nomes que querem dizer "perfeitos", "excelentes" ou, muito simplesmente, "ser humano" e ao "outro", ao estrangeiro, chamam, por vezes, de "macacos da terra" ou "ovos de piolho". De qualquer forma, a sociedade do "eu" é a melhor, a superior. É representada como o espaço da cultura e da civilização por excelência. É onde existe o saber, o trabalho, o progresso. A sociedade do "outro" é atrasada. É o espaço da natureza. São os selvagens, os bárbaros. São qualquer coisa menos humanos, pois, estes somos nós. O barbarismo evoca a confusão, a desarticulação, a desordem. O Selvagem é o que vem da floresta, da selva que lembra, de alguma maneira, a vida animal. O outro" é o "aquém" ou o "além", nunca o "igual" ao "eu".
Etnocentrismo: "etno" pode significar "cultura" e centrismo vêm da palavra centro, desta forma o etnocêntrico acredita que sua cultura é a melhor, a mais desenvolvida, é o centro das atenções, e se existem culturas diferentes da dele é por que não conseguem ser como a sua, são subdesenvolvidas. Com estes argumentos os europeus empreenderam a destruição de um número incalculável de culturas, e hoje esta atitude não é monopólio da Europa, já que ainda há pessoas que não sabem (ou não querem) respeitar o direito de cada povo ser como lhe provém.